Na Folha, Viana comenta trajetória do matemático Steve Smale

Reprodução da Coluna de Marcelo Viana na Folha de São Paulo.
No momento em que escrevo esta coluna, pesquisadores de diversas partes do mundo se reúnem na Universidade de Berkeley, na Califórnia, para comemorar o 95º aniversário e a extraordinária trajetória do matemático Steve Smale, cujas contribuições científicas se estendem da topologia, dos sistemas dinâmicos e da economia matemática à linguística, à teoria da complexidade e à bioinformática.
Seis décadas e meia atrás, no início de 1960, Smale estava no Rio de Janeiro para a primeira de muitas visitas ao então recém-criado Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa). Durante essa visita, ele provou a conjectura de Poincaré para esferas de dimensão 5 ou maior, feito que lhe valeu a medalha Fields.
Além disso, motivado por carta que recebeu do colega Norman Levinson em fevereiro daquele ano, ele descobriu a “ferradura de Smale”, um modelo matemático que explica o comportamento persistentemente complexo das soluções de certas equações diferenciais e que originou uma revolução na área dos sistemas dinâmicos.
Esse período de sua carreira também atraiu um grau de polêmica que os avanços em matemática raramente alcançam. A polêmica começou em 1966, quando Smale foi a Moscou para participar no Congresso Internacional de Matemáticos e receber a medalha Fields.
Os Estados Unidos viviam a controvérsia da guerra no Vietnã e Smale tinha papel ativo nos protestos, foi até intimado a depor perante o Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso. Em Moscou, ele convocou uma entrevista coletiva com jornalistas soviéticos, vietnamitas e norte-americanos na escadaria da universidade, em que criticou tanto a guerra no Vietnã quanto a invasão soviética da Hungria em 1956.
Ao final, chegou um carro preto com funcionários soviéticos que o levaram para um longo passeio com destino desconhecido. Segundo Smale, foi tratado com muito respeito e, finalmente, foi levado de volta à universidade, sem entender o que tinha acontecido. Mas o susto do passeio forçado não foi o pior.
As críticas à guerra, proferidas na capital da inimiga União Soviética, repercutiram mal nos Estados Unidos. A viagem fora paga com seu “grant” (bolsa-salário) e a universidade, alegando que havia desvio de função de recursos públicos, que só poderiam ser usados em atividades estritamente de pesquisa, suspendeu o pagamento.
Na carta pedindo que o pagamento fosse restabelecido, Smale explicou que os matemáticos fazem pesquisa o tempo todo, nas circunstâncias mais diversas (é verdade!), e deu um exemplo que “viralizou”: “Meus trabalhos mais famosos foram feitos nas praias do Rio de Janeiro”.
O argumento não convenceu o conselheiro científico do presidente Nixon: “Esse espírito jovial faz os matemáticos acreditarem seriamente que o contribuinte deveria aceitar que a criação matemática nas praias do Rio de Janeiro seja financiada com recursos públicos”.
Leia na íntegra no site da Folha de São Paulo.
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